Décadas de violência no Oriente Médio brutificaram cidadãos comuns. Muitos se acostumaram a ver o vizinho como uma ameaça a ser eliminada.
Os vídeos do festival de música no deserto de Negev em Israel feitos antes dos ataques do Hamas mostram cenas que qualquer brasileiro que já foi a uma festa de música eletrônica já viu: jovens dançando, namorando e, na média, vivendo momentos felizes. Quem poderia desejar que eles morressem?
Assim como uma busca rápida pela internet revela registros de dias comuns na Faixa de Gaza, com crianças correndo pelas ruas, pessoas escolhendo frutas nas feiras e profissionais tentando vencer as contas do mês no meio de uma economia difícil. É aceitável pensar que esse povo seja bombardeado, mesmo com a justificativa de não ser ele o alvo?
Num mundo ideal, gente dos dois lados da fronteira deveria ser capaz de enxergar a humanidade do outro lado e trabalhar em conjunto para uma solução mutuamente benéfica. Mas também, num mundo realmente ideal, talvez essa fronteira nem existisse.
A diplomacia com D maiúsculo tem cenários assim como farol. Ainda que seja difícil chegar até lá, trabalha-se tentando se mover na direção correta. O drama é que nem todos os atores políticos têm interesse em soluções que tragam paz e prosperidade para os dois lados e tentam mudar o rumo da marcha histórica.
Como lidar com um grupo terrorista que sequer reconhece o direito de Israel de existir? Existe alguma negociação possível quando a pauta é liberar o país dos “ocupadores”? Por outro lado, ataques muitas vezes desproporcionais, cerco e expansão forçada dos territórios não ajudam a melhorar o ambiente. Tampouco se vê vontade real de levar adiante a solução de dois estados.
É muito difícil pedir a um pai que perdeu um filho no festival de música que faça esse exercício de tentar entender o outro lado. O mesmo vale para a mãe que retira o corpo de uma criança dos escombros de um prédio bombardeado na Faixa de Gaza. Mas a tarefa da boa diplomacia é essa. Esse é o farol lá longe. Não é meta para esta semana, talvez nem para esta década, mas deve ser o rumo. O primeiro passo é a ação para cessar a violência, ainda que apenas no curto prazo, antes que ela gere mais episódios que deixem cicatrizes difíceis de serem suavizadas.
O caos instalado no Oriente Médio só faz crescer o ressentimento e facilita a ascensão do extremismo, seja com o Hamas, seja com setores da política israelense que crescem quando o ódio floresce.
A realidade factual é que, por mais que grupos dos dois lados da fronteira gostariam que o outro lado não existe, ninguém vai sair de onde está e o potencial explosivo de um conflito que sempre carregou consigo o risco de escalar para uma ameaça global estará presente.
Cabe à comunidade internacional trabalhar de maneira responsável para ajudar os israelenses e palestinos com vontade de paz a conseguirem ter mais liderança em suas comunidades. Parece ingênuo, mas pode não haver outra opção.