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Mudanças na ONU defendidas por Lula têm poucas chances de avançar, apontam especialistas

Presidente pediu mais representatividade de países nos órgãos de decisão e foco em segurança internacional



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Lula abriu a 79ª Assembleia Geral da ONU
Ricardo Stuckert / PR

As reformas na ONU (Organização das Nações Unidas) defendidas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva são pouco prováveis de ocorrer em um horizonte próximo, avaliam especialistas em relações internacionais e ciência política consultadas pelo R7. Entre os entraves destacados, estão as divergências internas dos países-membros e a posição brasileira em relação a temas sensíveis, como a situação de Venezuela e a Nicarágua, países governados por regimes autoritários.

Em discurso na abertura da 79ª Assembleia Geral, nessa terça (24), Lula voltou a criticar a ONU e pediu revisão da Carta Magna da instituição por não tratar “de alguns dos desafios mais prementes da humanidade”. O presidente argumentou que apenas quatro emendas foram aprovadas — todas entre 1965 e 1973 — e que na data de fundação a entidade contava com 51 países — hoje, são 193.

Entre os pedidos de mudança, Lula defendeu os seguintes pontos:

  • Transformação do Conselho Econômico e Social no principal foro para o tratamento do desenvolvimento sustentável e do combate à mudança climática, com capacidade real de inspirar as instituições financeiras;
  • Revitalização do papel da Assembleia Geral, inclusive em temas de paz e segurança internacional;
  • Fortalecimento da Comissão de Consolidação da Paz; e
  • Reforma do Conselho de Segurança, com foco em sua composição, métodos de trabalho e direito de veto, de modo a torná-lo mais eficaz e representativo das realidades contemporâneas.

“Estamos chegando ao final do primeiro quarto do século XXI com as Nações Unidas cada vez mais esvaziada e paralisada. É hora de reagir com vigor a essa situação, restituindo à Organização as prerrogativas que decorrem da sua condição de foro universal”, afirmou Lula no discurso da 79ª Assembleia Geral.

Professora de relações internacionais e doutora em ciência política pela USP (Universidade de São Paulo), Denilde Holzhacker avalia que o debate a respeito de mudanças na ONU tem avançado pouco. “Alguns pontos da proposta de reforma vêm sendo defendidos há anos pelo Itamaraty, que argumenta que os mecanismos de decisão e participação dos países devem ser democratizados. No entanto, essa proposta esbarra na lógica de falta de consenso dos países, especialmente daqueles que têm poder de veto [no Conselho de Segurança]”, observa.

Denilde acrescenta que o Brasil tem ficado cada vez com menos capacidade de liderar qualquer mudança. “Pela ambiguidade em diversas situações recentes, como a Venezuela e a Nicarágua. A visão brasileira é vista como imparcial em alguns eventos recentes”, explica.

Ela ressalta que as reformas defendidas por Lula têm pouco impacto na relação do Brasil com outros países. “No nível do discurso, todos concordam que seria importante ter uma reforma, mas, na prática, pouco se avança. Alemanha e Japão [também de fora do Conselho de Segurança] concordam com a necessidade de reforma. Não há um consenso sobre os caminhos para uma construção mais equilibrada e reforma do conselho. Mesmo no Sul Global, quando se discute quem teria direito a voto [no conselho], começam as divergências”, completa Denilde.

A professora de direito internacional da USP Maristela Basso concorda com a colega. “São pautas antigas que dependem de aprovação da Assembleia Geral, onde, de fato, o Brasil deveria trabalhar se pretendesse mesmo ter um protagonismo no que diz respeito aos temas levantados. A proximidade do Brasil com Venezuela, Rússia e China afastam o presidente Lula de assumir qualquer protagonismo revelante”, avalia.

Reformas

Lula defende mudanças em organismos multilaterais há pelo menos 20 anos, desde a primeira vez em que discursou na ONU, em 2003. As cobranças foram intensificadas com o retorno dele à presidência brasileira. Em setembro do ano passado, ele chegou a dizer que a organização ficou “enfraquecida” ao longo dos anos e incapaz de evitar guerras. A crítica foi feita antes dos ataques do grupo terrorista Hamas a um festival de música em Israel, que desencadeou o conflito na Faixa de Gaza.

“Países grandes como Egito e Nigéria precisam entrar no Conselho de Segurança para que a gente tenha uma representação geográfica mais condizente com a realidade de hoje. A ONU de 2023 está longe de ter a mesma credibilidade de 1945 [quando foi criada]. O Conselho de Segurança, que deveria ser a segurança da paz e da tranquilidade, é o Conselho de Segurança que faz a guerra sem conversar com ninguém”, declarou, à época.

“A Rússia vai para a Ucrânia sem discutir no Conselho de Segurança. Os Estados Unidos vão para o Iraque sem discutir no Conselho de Segurança. A França e a Inglaterra vão invadir a Líbia sem passar pelo Conselho de Segurança. Ou seja, quem faz a guerra são os países do Conselho de Segurança, quem produz armas são os países do Conselho de Segurança, quem vende armas são os países do Conselho de Segurança. Está errado”, acrescentou.

Ainda segundo o presidente, “a ONU já não representa mais” os princípios que nortearam a fundação do organismo. “Em 1948, a ONU conseguiu criar o estado de Israel. Em 2023, ela não consegue fazer cumprir a área reservada aos palestinos. Ela ficou enfraquecida.”



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