Uma nova polêmica cada vez que se afasta do noticiário. Tem sido assim o governo de Javier Milei, utilizando a estratégia já adotada por outros líderes ultradireitistas de manter a militância sempre mobilizada.
Até agora, o presidente brasileiro havia sido poupado da metralhadora verbal do argentino.
Milei xingou o líder colombiano Gustavo Petro de terrorista, insinuou que Begoña Gómez, esposa do primeiro-ministro espanhol, era corrupta, mas não ousava mexer com o Brasil, nem com a China, países dos quais a Argentina é altamente dependente.
Lula havia sido chamado de corrupto e comunista durante a campanha, mas o tom foi mais comedido após Milei assumir a presidência.
Depois de o brasileiro exigir um pedido de desculpas em uma entrevista ao portal UOL, a Casa Rosada já dava sinais de que isso não aconteceria.
Na sexta-feira, Milei foi além e reafirmou as ofensas ao presidente brasileiro numa entrevista ao jornal La Nación.
“Chamei de corrupto. Não foi preso por corrupção? Chamei de comunista. Não é comunista?”
Por muito menos, o governo espanhol retirou o embaixador do país em Buenos Aires, mas até aqui o Itamaraty parece adotar a tática de fingir que não ouviu. Quando um não quer, dois não brigam.
Agora veio a notícia de que Milei não vai participar da cúpula do Mercosul, marcada para a próxima segunda-feira (8), em Assunção, no Paraguai.
Seria difícil evitar Lula em um foro tão reduzido, e apenas a chancelaria argentina estará no encontro.
Não bastasse isso, a Casa Rosada informou que Milei confirmou presença no fim de semana na Conferência Política de Ação Conservadora em Balneário Camboriú, Santa Catarina.
Ali são esperadas imagens de popstar com a plateia amplamente favorável, além de fotos e vídeos ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O governo Lula pode ser alvo outra vez.Em relação à China, a Argentina vem suando a camisa para não perder uma linha de crédito de US$ 5 bilhões em um momento em que cada centavo conta para que as finanças públicas não entrem em colapso.
Um dos poucos países do mundo com liderança realmente comunista nunca teve seus líderes na mira de Milei.
A relação com o Brasil é mais complexa.São duas nações que dependem de si mutuamente, ainda que haja alguma vantagem na comparação para o vizinho do norte.
Recentemente, a Petrobras evitou que o abastecimento de gás entrasse em colapso na Argentina.
O Itamaraty entrou na negociação para que a estatal brasileira aceitasse uma garantia de pagamento à qual não estava acostumada antes de liberar um navio de GNL.
Com a manobra, a falta de combustível nos postos durou apenas um dia.
A cada destempero verbal do presidente, a Casa Rosada diz que o importante é a relação entre os países, não entre os líderes.
Nada mais falso. Uma possível má vontade de uma liderança pode emperrar negociações complexas ou deixar de socorrer o parceiro quando a água estiver subindo.
Milei ainda está no período de lua de mel com o eleitorado.Por seu perfil ideológico, é provável que essa fase se estenda, ao menos no núcleo duro dos apoiadores.
Mas a oposição interna pode começar a crescer entre a maioria dos argentinos se resultados melhores na economia não aparecerem.
Em se tratando de apoio do Exterior, pode ser que lhe falte ajuda em momentos cruciais se não começar a cultivar relações mais construtivas.