O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), tem sinalizado a interlocutores que o projeto de lei, que anistia os presos pelos atos extremistas que aconteceram em 8 de janeiro de 2023, não está enterrado. Contudo, que o assunto precisa amadurecer.
A aliados, o deputado alagoano indicou que não houve pressão nem da ala governista ou da oposição após ele tirar a proposta da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e criar uma comissão especial. Lira tem indicado que o assunto foi decantando e que não era prudente votar projetos no calor do momento.
Após anunciar a criação da comissão especial, Lira não oficiou os líderes para indicarem os membros do colegiado, portanto, a comissão ainda não foi instalada.
A votação do projeto passou pelas negociações à presidência da Câmara. O PL, de oposição, ainda considera que o tema será enfrentado pela Casa em 2025. Candidato a sucessor de Lira, o deputado Hugo Motta (Republicanos) defendeu análise “cautelosa” sobre o assunto, mas não garantiu que será pautado.
Entenda a proposta
Em 8 de janeiro de 2023, extremistas invadiram as sedes dos Três Poderes e depredaram as instalações. Eles não concordavam com a eleição nem com a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O relator do PL da Anistia, deputado federal Rodrigo Valadares (União Brasil-SE), contudo, defende que os atos de vandalismo “foram inflamados principalmente pelo sentimento de injustiça aos quais muitos brasileiros sentiram após o resultado do segundo turno das eleições presidenciais de 2022″.
O texto, que teve sete projetos como base, anistia “todos os que participaram de manifestações com motivação política e/ou eleitoral, ou as apoiaram, por quaisquer meios, inclusive contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais e plataformas, entre o dia 08 de janeiro de 2023 e o dia de entrada em vigor desta lei”.
Conforme o projeto, o perdão alcança os “crimes com motivação política e/ou eleitoral”. A anistia abrange “quaisquer medidas de restrições de direitos, inclusive impostas por liminares, medidas cautelares, sentenças transitadas ou não em julgado que limitem a liberdade de expressão e manifestação de caráter político e/ou eleitoral, nos meios de comunicação social, plataformas e mídias sociais”.
O projeto ainda inclui no perdão todos que participaram de “eventos subsequentes ou eventos anteriores” ao 8 de janeiro, “desde que mantenham correlação com os eventos acima citados”.
A anistia, contudo, não alcança os crimes de:
- Prática da tortura;
- Tráfico ilícito de entorpecentes, drogas e afins;
- Terrorismo e os definidos como crimes hediondos;
- Crimes contra a vida;
- Crime contra patrimônio histórico; e
- Crime contra coisa alheia.
O relator ainda incluiu um trecho que anula as multas aplicadas pela Justiça Eleitoral ou comum às pessoas físicas e jurídicas em decorrência do 8 de Janeiro.
Isso poderia alcançar o Partido Liberal, multado em mais de R$ 22 milhões por litigância de má-fé após a legenda pedir a anulação de votos do segundo turno da disputa presidencial em 2022. Como a sigla pagou o montante, o valor teria de ser estornado, caso a redação final do texto seja promulgada dessa forma.
Mudança em tese do STF
O projeto ainda inclui um artigo que, se aprovado, derrubaria a principal tese do STF (Supremo Tribunal Federal) para condenar os presos do 8 de Janeiro: o crime multitudinário — cometido por uma multidão em tumulto, de forma espontânea e organizada. O STF aplicou essa tese para condenar os envolvidos no episódio por atentado ao Estado Democrático de Direito.
Com a proposta, só poderá haver condenação por tal crime se for individualizada, ou seja, não poderá ter condenação conjunta quando o crime for contra ou para depor a democracia.
O projeto altera ainda o decreto-lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940, que trata sobre os crimes contra o Estado Democrático de Direito. A redação atual prevê que atentar contra a democracia é “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”.
Mas com a alteração da proposta, o crime contra o Estado Democrático de Direito só será considerado se for contra a “pessoa”, com a seguinte redação: “Tentar, com emprego de violência contra a pessoa ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos Poderes constitucionais”.
Segundo o texto, a condenação pelos crimes contra a democracia “não admite a incidência da figura do crime multitudinário, tampouco de qualquer teoria similar fundada na desindividualização ou na generalidade das condutas, exigindo-se, como pressuposto para a condenação, a individualização concreta dos atos praticados por cada coautor ou partícipe”.
O PL da Anistia ainda altera trechos da lei sobre o foro privilegiado, estabelecendo que, nos casos que envolvam pessoas com prerrogativa de foro e pessoas comuns, as que têm foro deverão ser julgadas primeiro e, depois disso, os demais investigados serão deslocados para a instância da Justiça comum.