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Governo de Lula defendeu trechos ambientais e socioeconômicos no acordo comercial entre Mercosul e União Europeia

Negociações retomadas em 2023, quando petista reassumiu presidência, são chamadas de ‘Pacote de Brasília’, com 10 pontos



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Presidente da Comissão Europeia participou da cúpula do Mercosul
Ricardo Stuckert/Presidência da República – 6.12.2024

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu a inclusão de trechos ambientais e socioeconômicos no acordo comercial entre Mercosul e União Europeia, para viabilizar a conclusão do tratado, anunciada nessa sexta (6). Desde que voltou à presidência, em janeiro de 2023, o petista retomou as discussões sobre a parceria, travadas desde 2019. Os diálogos patrocinados por Lula desde o ano passado são chamados de “Pacote de Brasília”, que tem 10 pontos principais, entre participação social, sustentabilidade e compras governamentais (leia mais abaixo).

Segundo o governo brasileiro, as conversas sobre o acordo foram aprimoradas para incluir interesses do Brasil. “A etapa negociadora iniciada em 2023 ocorreu em contexto político e econômico distinto, marcado pela experiência da pandemia, pelo agravamento da crise climática e pelo acirramento de tensões geopolíticas, elementos que ofereceram um novo pano de fundo para as negociações. Além disso, o governo do presidente Lula entendeu necessário fazer ajustes específicos aos termos negociados em 2019, a fim de tornar o acordo mais favorável aos interesses brasileiros”, destacou, em nota.

As discussões iniciadas em 2023 tinham como finalidade construir textos para temas cuja incorporação ao acordo foram acordadas pelos dois lados. Esses novos pontos destacam, sobretudo, as áreas de comércio e desenvolvimento sustentável e mecanismo de reequilíbrio de concessões, cooperação e revisão do texto. Desde o ano passado, as conversas também focaram a adaptação de termos para aprimorar o acordo ao cenário político e econômico mais recente, especificamente no que diz respeito a compras governamentais, comércio de veículos, exportação de minerais críticos e direitos autorais.

Temas ainda em aberto desde 2019 também foram debatidos pelo Mercosul e União Europeia nos diálogos retomados em 2023. Entre os assuntos pendentes, estavam indicações geográficas e regras sobre a implementação do acordo. Veja abaixo os 10 pontos do “Pacote de Brasília”.

1. Novo anexo ao capítulo sobre comércio e desenvolvimento sustentável, reforçando o compromisso dos dois lados com a agenda ambiental, social e econômica. Série de compromissos de proteção ao meio-ambiente e de promoção do trabalho decente. Há previsão de cooperação na implementação de relevantes acordos multilaterais, como a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), o Acordo de Paris, a Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD) e Convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Mercosul e UE acordaram também adotar ações para a promoção de produtos sustentáveis no comércio birregional, promovendo oportunidades para pequenos produtores, cooperativas, povos indígenas e comunidades locais. O novo Anexo também conta com seção dedicada à promoção de cadeias de valor sustentáveis para a transição energética. Ademais, pela primeira vez, um acordo comercial do Mercosul contará com dispositivos sobre comércio e empoderamento feminino, com vistas a favorecer a cooperação e troca de melhores práticas em políticas que promovam a participação das mulheres no comércio internacional.

2. Compromisso com abordagem cooperativa a respeito de medidas sustentáveis domésticas que impactam o comércio. No novo anexo de comércio e desenvolvimento sustentável, a UE se comprometeu a utilizar os dados de autoridades do Mercosul na avaliação da compatibilidade das importações provenientes do bloco sul-americano com requisitos de conformidade estabelecidos por legislações do grupo europeu. Esse compromisso é um reconhecimento da qualidade dos dados produzidos por instituições dos países do Mercosul para a implementação de legislações europeias. As partes também reconheceram que as medidas ambientais que impactam o comércio devem ser consistentes com os Acordos da Organização Mundial do Comércio (OMC), não devem constituir restrição disfarçada ao comércio e devem ser baseadas em informações técnicas e científicas. As partes acordaram que o novo anexo negociado não implica endosso das exigências ambientais adotadas por um lado e outro, reservando-se, nesse contexto, seus direitos no âmbito da OMC.

3. Compras governamentais como instrumento de política industrial e desenvolvimento econômico. O Brasil propôs ajustes nos termos que haviam sido tratados no passado, para preservar o uso do poder de compra do Estado como ferramenta da nova política industrial brasileira. Dentre os ajustes promovidos, merece destaque a completa exclusão das compras realizadas pelo SUS (Sistema Único de Saúde); a preservação da possibilidade de encomendas tecnológicas, importante política de fomento à inovação; a eliminação de restrições temporais ao uso de offsets tecnológicos e comerciais; a manutenção de espaço para políticas de incentivo a micro e pequenas empresas e agricultura familiar; e a preservação de margens de preferências para produtos e serviços nacionais.

4. Setor automotivo com eliminação tarifária em período mais longo. Com novas rotas tecnológicas para viabilizar a transição energética, o setor automotivo passa por transformação importante mundo afora. Nesse cenário, e diante da importância do setor para o Brasil, o Mercosul negociou condições mais flexíveis para a redução tarifária para veículos eletrificados e para veículos de novas tecnologias, mesmo as ainda não disponíveis comercialmente. Nesta etapa negociadora, o bloco sul-americano destacou certos veículos do cronograma aplicável a veículos a combustão, anteriormente definido com eliminação de tarifas em 15 anos. Para veículos eletrificados, a desgravação passará a se dar em 18 anos. Para veículos a hidrogênio o período será de 25 anos, com seis anos de carência. Para novas tecnologias, 30 anos, com seis anos de carência. Até esta etapa negociadora, nenhum cronograma de desgravação era superior a 15 anos.

5. Criação de uma salvaguarda de investimentos para o setor automotivo. Foi estabelecido um mecanismo inédito de salvaguardas para preservar e ampliar investimentos automotivos. Caso haja aumento de importações europeias com dano à indústria nacional, o Brasil pode suspender o cronograma de desgravação de todo o setor ou retomar a alíquota aplicável às demais origens (hoje, de 35%) por um período de três anos, renovável por mais dois anos, sem necessidade de oferecer compensação à União Europeia. A avaliação levará em conta parâmetros como o nível de emprego, volumes de venda e produção, capacidade instalada e grau de ocupação da capacidade do setor automotivo. Esta salvaguarda de investimentos automotivos é mais facilmente acionável do que a salvaguarda geral prevista no acordo.

6. Adoção de flexibilidade para políticas públicas sobre minerais críticos. A partir da renegociação de 2023-2024, o Brasil garante o direito de aplicar restrição às exportações de minerais críticos se julgar apropriado, por exemplo, para estimular a agregação de valor no país. Caso o Brasil venha a adotar imposto de exportação a esses produtos (o que não é o caso hoje), a alíquota aplicável à UE deverá ser mais baixa do que a incidente sobre outros destinos, sem ultrapassar 25%. O pré-acordo adotado em 2019 proibia qualquer incidência de direito às exportações no comércio entre Brasil e União Europeia.

7. Criação de um mecanismo de reequilíbrio do acordo para evitar que medidas unilaterais comprometam concessões comerciais negociadas. De forma inédita, foi agora estabelecido um mecanismo para evitar que medidas unilaterais das partes prejudiquem o equilíbrio estabelecido no acordo, uma vez que tais medidas têm o potencial de comprometer concessões comerciais negociadas e desequilibrar o resultado acordado. Após o “acordo político” de 2019, a União Europeia adotou legislações que, a depender da forma de implementação, podem romper o equilíbrio refletido no entendimento de 2019 naqueles temas que não foram renegociados na etapa iniciada em 2023. É o caso, por exemplo, das cotas oferecidas pela UE para a exportação de carnes do Mercosul, que não foram reabertas na etapa de 2023.

8. Sociedade civil, sindicatos e organizações empresariais com direito a participação na revisão do acordo. Com base no pacote negociado em 2023-2024, o processo de revisão da implementação do acordo passa a ser mais inclusivo. A revisão, que tem como objetivo avaliar os impactos do texto no emprego, investimento e comércio entre as partes, deverá considerar opiniões e recomendações de atores da sociedade civil, como ONGs, organizações empresariais e de empregadores, movimentos sociais e sindicatos. O exercício periódico de revisão dos impactos do acordo poderá levar os governos das partes a negociar emendas ao texto.

9. Recursos de cooperação para apoiar países do Mercosul a se beneficiarem do acordo. Juntamente com a conclusão do acordo, a UE oferecerá pacote para apoiar países do Mercosul na implementação do acordo, em particular nos aspectos comerciais, tendo em conta a importância, em particular, de apoiar setores mais vulneráveis. Esse compromisso está associado à conclusão de um Protocolo de Cooperação, sob o qual Mercosul e União Europeia colaborarão para definir as prioridades dos programas a serem apoiados.

10. Conclusão de temas pendentes das negociações de 2019. A etapa negociadora de 2023-2024 também viabilizou a conclusão de temas que ainda estavam em aberto em 2019, como indicações geográficas — por exemplo, para vinhos. Nessa etapa, foram negociadas disciplinas que delimitam os direitos de detentores de indicações geográficas, dentre outras aquelas que salvaguardam, nos países do Mercosul, os usuários prévios de nomes geográficos europeus que serão protegidos pelo acordo.



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