Saulo Moura da Cunha, então diretor responsável pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin), afirmou nesta terça-feira, 1º, que alertou pessoalmente o então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do governo Lula, general Edson Gonçalves Dias, conhecido como G. Dias, para o agravamento dos riscos de invasão das sedes dos Três Poderes da República no dia 8 de Janeiro. A revelação de Cunha foi feita em depoimento a parlamentares na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga os ataques golpistas em Brasília.
“Eu comecei a falar por volta das 8h no dia 8 de janeiro com o general G. Dias e a encaminhar informações que recebia, inclusive ressaltando a informação dos 105 ônibus (que chegaram a Brasília com golpistas)”, afirmou Cunha em depoimento aos parlamentares.
O depoimento foi explorado por bolsonaristas para tentar alegar uma suposta omissão do governo federal na prevenção e resposta aos ataques golpistas. Por outro lado, parlamentares da base do governo buscaram explorar que autoridades do Governo do Distrito Federal foram também alertadas para os riscos e não evitaram a invasão.
Cunha disse aos parlamentares que, até dois dias antes dos ataques, a Abin tinha informações sobre a chegada de que estava prevista a chegada de 43 ônibus fretados a Brasília, com extremistas. Mas, na véspera, com novas informações da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), essa previsão mais do que dobrou e a Abin passou a esperar 105 fretados em Brasília. Cunha diz ter atualizado G. Dias sobre essa nova previsão por volta das 8h do dia 8 de Janeiro, no que recebeu como resposta do então chefe do GSI por WhatsApp: “Acho que vamos ter problemas”.
Com o início do deslocamento dos extremistas em direção à Praça dos Três Poderes, Cunha diz que voltou a falar com o então chefe do GSI, para manifestar sua preocupação com uma invasão ao Palácio do Planalto, ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF). O então chefe da Abin diz que ligou para G. Dias por volta das 13h30 daquele dia. “Falei: nós temos a impressão, uma certa convicção, nesse momento em que a marcha se deslocava, de que as sedes dos poderes serão invadidas ou que haverá ação violenta”, afirmou Cunha à CPI.
Embora tenha informado aos parlamentares que, entre o dia 2 de janeiro e o fim do dia 8 de janeiro, a Abin produziu 33 alertas sobre a evolução dos riscos, Cunha afirmou que, exceto por G. Dias, não pode afirmar que outras autoridades do governo federal foram alertadas. “Não temos como saber se alerta foi recebido. Há compromisso de todos os órgãos de se manter a par das informações”, afirmou.
O depoimento dele foi solicitado à comissão por cinco parlamentares da oposição: os deputados Alexandre Ramagem (PL-RJ), Marco Feliciano (PL-RJ) e Nikolas Ferreira (PL-MG), e os senadores Izalci Lucas (PSDB-DF) e Magno Malta (PL-ES). O objetivo dos requerimentos é tentar demonstrar que houve negligência por parte do governo Lula na contenção dos manifestantes no 8 de janeiro.
O pedido feito pelo senador Izalci foi o mais incisivo sobre essa intenção. Ele reúne reportagens que mostram trechos de um alerta que foi emitido pela Abin na véspera dos atos antidemocráticos e acusa a gestão petista de não ter adotado providências adequadas.
“Quase ninguém foi trocado na semana em que tudo foi planejado. É que o novo governo não tinha uma equipe. À exceção de Saulo, as outras diretorias não foram nomeadas e para que não ficassem vagas, os diretores que ocupavam as funções não puderam ser exonerados. Durante a semana, a situação na agência foi descrita como de caos”, diz o requerimento do senador.
Entre os dias 2 e 8 de janeiro, a Abin emitiu 19 informes sobre as movimentações que estavam sendo feitas por radicais. No dia 7, véspera dos ataques, a quantidade de ônibus que chegou a Brasília e o número estimado de pessoas que se deslocaram à cidade também foram informados pela agência.