Uma pesquisa feita na Universidade de São Paulo (USP) identificou a expressão intensa de um gene em seis mulheres que, durante a pandemia de Covid-9, não apresentaram a doença apesar de estarem em convívio próximo com pessoas que foram infectadas.
A ideia do trabalho surgiu da observação do caso pessoal da pesquisadora de saúde Maria Tereza Malheiros Sapienza. Durante a pandemia, apesar de ter cuidado do marido – o médico Marcelo Sapienza, que foi infectado pelo vírus da Covid em duas ocasiões – Maria Tereza não desenvolveu sintomas da doença.
A partir da história contada pela colega, os pesquisadores começaram a acompanhar casais que eram sorodiscordantes, situação na qual um dos parceiros se infecta e o outro não.
Foram analisados 86 casais, sendo que apenas seis continuaram sorodiscordantes entre 2020 e 2023. As seis pessoas mais resistentes ao vírus foram mulheres, o que levou os pesquisadores a realizarem exames genéticos em busca de alguma característica em comum entre elas que explicasse essa proteção extra.
Mulheres tinham proteção extra contra a Covid
Os resultados foram publicados na revista Frontiers in Cellular and Infection Microbiology em 26/11. Nos seis casos, as mulheres tinham expressão aumentada do gene IFIT3 em comparação com os maridos. Já a expressão desse mesmo gene entre mulheres que, posteriormente, tiveram infecções sintomáticas foi baixa, semelhante à dos maridos.
“Trata-se de um gene que faz parte da resposta antiviral. Ele já foi descrito em estudos anteriores como sendo relacionado à proteção contra outras doenças virais, entre elas dengue, hepatite B e adenovírus. Só que, em nosso trabalho, conseguimos, pela primeira vez, provar esse efeito protetor para além da teoria, pois é muito improvável que as seis mulheres não tenham sido expostas a Covid numa condição em que cuidaram dos maridos infectados”, explicou o pesquisador Mateus Vidigal, primeiro autor do artigo, em entrevista à Agência Fapesp.
A maneira de agir dos vírus consiste em invadir as células do hospedeiro e se multiplicar dentro delas. Segundo a hipótese dos pesquisadores, a proteína IFIT3, produzida pelo gene de mesmo nome, neutraliza o vírus antes que ele inicie a reprodução, impedindo que a doença se multiplique no corpo das pessoas que o possuem.
Além de encontrar uma explicação para uma situação bastante vivida na pandemia – a resistência de um dos parceiros ao vírus da Covid -, o estudo também aprofundou os conhecimentos sobre o IFIT3.
“O estudo nos permite ter certeza quase absoluta de que as mulheres foram expostas ao vírus e apresentaram resistência, então podemos quase nos assegurar de que encontramos um biomarcador de resistência, mas ainda nos falta entender por que algumas pessoas expressam mais esse gene do que outras”, conclui o professor de medicina da USP Edecio Cunha Neto, também em entrevista à Fapesp.