Foi essa circunstância que levou a professora Cáren Baldo e seu marido, o empresário Luis Guilherme Menezes, a deixar o apartamento do Menino Deus pela segunda vez em menos de 20 dias — o casal saiu do imóvel novamente em 23 de maio.
“A gente não imaginava que a água ia subir do jeito que subiu. O nível atingido antes em dois dias da segunda vez foi alcançado em duas horas”, afirma Cáren, que atualmente está morando novamente no imóvel.
O repique da inundação nos dias 23 e 24 de maio provocou uma reviravolta na orientação da prefeitura. Em uma postagem nas redes sociais, a administração afirmou: “Até a estabilização do clima, pedimos que a população evite colocar o lixo nas ruas nos próximos dias. Com a previsão de chuva e vento forte, é importante evitar acúmulo de resíduos que possam ser levados pela água”.
Apesar das orientações desencontradas, Hundertmarker afirma que o lixo nas ruas depois do primeiro período de inundações não foi responsável pelo entupimento da rede.
“Visualmente nós até vimos [lixo boiando em] algumas áreas, mas não impactou em nenhum momento na obstrução de bocas de lobo”, diz o diretor-geral do DMLU.
Outra preocupação é com os bota-espera, como foram designados os lixões temporários criados pela prefeitura em vários pontos da cidade.
A medida teve por finalidade facilitar a logística de descarte, coleta e armazenamento de inertes, como são definidos os rejeitos da enchente.
Na escala de contaminação estabelecida pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), os inertes ocupam uma posição intermediária (II B).
Não são excessivamente tóxicos a ponto de ser classificados como perigosos (ao lado do lixo hospitalar e de certos tipos de resíduos industriais) nem suficientemente inofensivos para figurar ao lado dos não-inertes (entre os quais encontra-se a maior parte do lixo doméstico).
No Complexo Cultural do Porto Seco, local previsto com uma das futuras “cidades temporárias” planejadas pelo governo do Estado para desabrigados, um bota-espera foi alvo de uma representação do vereador Jonas Reis (PT) apresentada ao Ministério Público do Estado.
A estrutura, disse o parlamentar, “tornou o espaço público insalubre, sem nenhum tipo de manta de proteção no solo, misturando lixo orgânico que as pessoas dispensaram junto com dejetos da enchente que também estão contaminados”.
O presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes), Paulo Robinson Samuel, também fez críticas ao local.
“Vi pessoas catando material no meio daquele monte de resíduos. Não podemos esquecer que esses dejetos estão contaminados. Podem conter ratos, escorpiões e baratas, além de urina de roedores. As pessoas podem pegar doenças. Além de exalar gases, a partir de dois ou três dias os resíduos podem gerar chorume capaz de contaminar o lençol freático”, afirma.
No sábado (8/6), um grupo de moradores do bairro Humaitá protestou contra a presença de um bota-espera nas imediações da Arena do Grêmio. O prefeito Sebastião Melo (MDB) foi até o bairro e garantiu que o lixo será removido para outro local.
Hundertmarker diz que os bota-espera foram fundamentais para dar segurança e agilidade à coleta nos bairros feita por caminhões pequenos.
O DMLU reconhece ter orientado a população a utilizar apenas cinco estruturas (duas no Centro Histórico, uma delas desativada no início do mês de junho, uma no bairro Serraria, outra no bairro Humaitá e outra no bairro São Geraldo).
Na terça-feira (11/6), o órgão informou que o lixão do Porto Seco “ainda (está) sendo encerrado”. Não há previsão para término das operações dos outros quatro.
O diretor técnico da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), Gabriel Ritter, defende que os bota-espera foram fundamentais para retirar montanhas de resíduos da cidade e devolver dignidade aos moradores.
“Na região metropolitana, é praticamente a casa inteira das pessoas que está indo para a rua”, observa.
“À medida que se diminui o lixo nas casas, será possível reduzir o número de carretas de resíduos em circulação e fazer a completa recuperação do espaço urbano.”