A transição para fontes de energia renováveis no Brasil enfrenta desafios técnicos e econômicos, especialmente em áreas rurais como Palmeira. João Pedro Cuthi Dias, engenheiro agrônomo, detalha esses obstáculos e as soluções potenciais para transformar uma região em um polo de energia renovável.
“O Brasil é um dos campeões mundiais em biocombustíveis. Começamos com o etanol e dominamos essa tecnologia”, diz Dias. “Hoje, estamos avançando com o etanol de segunda geração, transformando resíduos agrícolas em etanol e biodiesel. Cerca de 13% do óleo diesel no Brasil já é biodiesel, derivado principalmente da soja.”
Dias explica que, apesar do sucesso com a soja , é importante diversificar as fontes de biocombustíveis para descarbonizar o setor energético. “A soja é predominante porque temos disponibilidade e infraestrutura. Mas outras culturas, como a bocaiuva e o cranberry, têm potencial para produzir muito mais óleo por hectare. No entanto, a falta de uma cadeia produtiva organizada impede o avanço dessas alternativas.” A bocaiuva, por exemplo, pode produzir até 5.000 litros de óleo por hectare, enquanto a soja produz apenas 120 litros por hectare. “A bocaiuva é uma planta nativa com múltiplas utilidades. A casca pode ser usada como combustível, a polpa é rica em vitamina A e o óleo podem servir tanto para o consumo humano quanto para a produção de combustíveis como diesel verde e querosene de aviação”, comenta Dias. “Mas, sem uma cadeia organizada, essa produção nunca será viável.”
Um dos maiores desafios é a falta de organização e mercado para novas culturas. “Precisamos criar condições para que pequenos produtores possam produzir e plantar bocaiuva. Há projetos promissores, como um na Bahia que abrange 200 mil hectares, mas é necessário expandir e organizar esses esforços.”
O Mato Grosso do Sul está à frente dessa iniciativa, com um programa que inclui 700 produtores pequenos e médios. “Esses produtores estão coletando e plantando bocaiuva, e já estão produzindo óleo para consumo humano e produção microcinética. À medida que a produção aumenta, o óleo será destinado à produção de combustíveis verdes”, destaca Dias. “O programa abrange toda a cadeia produtiva, desde a produção de mudas até a coleta e produção, além de incluir incentivos de crédito de carbono.”
A pesquisa científica desempenha um papel fundamental na viabilização dessa transformação. “Uma pesquisa baseada em materiais genéticos com alto potencial. O mesmo deve ser feito com a bocaiuva: encontrar plantas com maior vigor e produtividade, e multiplicá-las”, afirma Dias. “Esse conhecimento precisa chegar ao pequeno produtor. A pesquisa pode desenvolver técnicas como a modificação clonal para aumentar a produtividade, semelhante ao que foi feito com o eucalipto.”
Dias enfatiza a importância da pesquisa para apoiar os produtores rurais. “A pesquisa é fundamental para auxiliar esses produtores a adotar novas práticas. No passado, chegamos com baixos rendimentos de soja no Rio Grande do Sul e, através da pesquisa, conseguimos aumentar significativamente a produtividade no Centro-Oeste.”
Veja a entrevista com João Pedro Cuthi Dias na íntegra