Este sábado (24) marca o segundo aniversário da guerra na Ucrânia, que parece estar na fase mais vulnerável desde os primeiros dias do conflito mais mortal na Europa desde a Segunda Guerra Mundial.
Os 40 milhões de habitantes da ex-república soviética desafiaram as expectativas — e os planos mais elaborados do Kremlin — ao repelir um inimigo muito maior e evitar a derrota total nos dias e semanas após os tanques e soldados russos avançarem em direção a Kiev.
Mas, à medida que a guerra entra no seu terceiro ano, a ajuda internacional e os fornecimentos militares se esgotam, afetando o campo de batalha onde a contra-ofensiva ucraniana fracassou, com Moscou obtendo ganhos territoriais.
Ainda assim, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, ainda tem muitos amigos importantes. Neste sábado (24), ele recebe os líderes ocidentais para discutir garantias de segurança, sanções contra a Rússia e outras questões urgentes.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, continua sendo um aliado firme, embora US$ 61 bilhões em ajuda estejam retidos por disputas políticas em Washington.
Olhando para o final de 2024, as eleições nos EUA poderão mudar o presidente e a política norte-americana em relação à Ucrânia e à guerra com a Rússia, deixando as perspectivas para os próximos anos obscuras.
Durante uma viagem aos Estados Unidos em novembro, Zelensky convidou o candidato republicano à Presidência, Donald Trump – um crítico veemente do apoio dos EUA a Kiev – para ir à Ucrânia para ver os danos causados pelas batalhas.
Zelensky também disse aos políticos norte-americanos que a Rússia, liderada pelo presidente Vladimir Putin, pode não parar nas fronteiras da Ucrânia se sair vitoriosa.
Putin, por sua vez, considera tais afirmações absurdas. Ele classifica a guerra como uma luta mais ampla com os Estados Unidos, país que a elite do Kremlin diz ter como objetivo dividir a Rússia.
Já o Ocidente vê a invasão como um ato de agressão injustificado que deve ser repelido.
Passado e presente da guerra
Além de receber autoridades estrangeiras, Zelensky participará de uma videoconferência com os líderes do G7. Haverá eventos em toda a Ucrânia, incluindo um serviço de comemoração para aqueles que morreram em Bucha, ao norte de Kiev – cenário de alguns dos piores crimes de guerra alegados no conflito.
O procurador-geral da Ucrânia destacou na sexta-feira (23) que iniciou investigações sobre mais de 122 mil supostos casos de crimes de guerra nos últimos dois anos. A Rússia nega as acusações.
O choque inicial da invasão se transformou gradualmente em familiaridade e depois em fadiga, à medida que o mundo assistia aos ganhos iniciais da Rússia e a uma impressionante contra-ofensiva ucraniana no final de 2022, que se transformou em uma guerra de trincheiras desgastante.
Em cenas que lembram os campos de batalha da Primeira Guerra Mundial, soldados sob forte fogo de artilharia morrem aos milhares, às vezes por alguns quilômetros de terra.
Entretanto, ambos os lados desenvolveram frotas enormes e cada vez mais sofisticadas de drones aéreos, marítimos e terrestres para vigilância e ataque, uma utilização sem precedentes de veículos não tripulados que poderá apontar o caminho para conflitos futuros.
A Rússia, com uma população muito maior para reabastecer as fileiras do Exército e um orçamento militar maior, poderá favorecer uma guerra prolongada, embora os custos tenham sido enormes para Moscou, à medida que procura lidar com sanções e uma dependência crescente da China.
A posição da Ucrânia é mais precária. Aldeias, vilas e cidades foram arrasadas, as tropas estão exaustas, as munições estão acabando e chovem mísseis e drones russos quase diariamente.
No início de fevereiro, a Rússia registou sua maior vitória em nove meses, quando capturou a cidade oriental de Avdiivka, pondo fim a meses de combates urbanos mortais.
Mesmo assim, Zelensky permaneceu desafiador antes do marco de dois anos.
“Estou convencido de que a vitória nos espera, em particular, graças à unidade e ao seu apoio”, pontuou ele a diplomatas em Kiev esta semana, em discurso emocionado.
Dezenas de milhares de soldados foram mortos em ambos os lados e dezenas de milhares ficaram feridos, enquanto milhares de civis ucranianos morreram. Moscou diz que visa apenas alvos militares e estratégicos.
Aumento de custos
Após dois anos de batalhas, escala da devastação na Ucrânia é impressionante.
Um estudo recente do Banco Mundial afirmou que a reconstrução da economia da Ucrânia poderia custar quase US$ 500 bilhões. Dois milhões de unidades habitacionais foram danificadas ou destruídas e quase seis milhões de pessoas fugiram para o exterior.
Além de arrecadar dinheiro e armas para continuar a guerra, Zelensky está aprovando uma legislação no Parlamento que permite à Ucrânia mobilizar mais 500 mil soldados. Esse objetivo, porém, poderia paralisar a economia, de acordo com especialistas.
Do outro lado, as finanças da Rússia revelaram-se até agora resistentes às sanções sem precedentes. Embora as exportações de gás natural tenham caído, os embarques de petróleo mantiveram o nível anterior, em grande parte graças às compras indianas e chinesas.
O PIB da Rússia cresceu 3,6% em 2023, embora alguns economistas que estão na Rússia tenham alertado que isto foi impulsionado por um salto nos gastos com defesa e que estagnação ou recessão se aproximam.
Ainda assim, isso não comprometerá a vitória de Putin nas eleições presidenciais de março, que deve vencer por uma margem esmagadora, em meio a um amplo apoio ao seu desempenho e à guerra, descrita pelo Kremlin como uma “operação militar especial”.
Nos últimos dois anos, as autoridades russas reprimiram duramente qualquer forma de dissidência sobre o conflito. Em 16 de fevereiro, o mais formidável opositor interno de Putin, Alexei Navalny, morreu nem uma colônia penal no Ártico, onde cumpria pena de 30 anos.
Na sexta-feira (23), Putin se dirigiu às tropas que lutam na Ucrânia enquanto a Rússia comemorava o Dia do Defensor da Pátria, saudando os soldados como heróis que lutam pela “verdade e justiça”.
Ele depositou uma coroa de flores no túmulo do soldado desconhecido, ao pé do muro do Kremlin, para homenagear aqueles que morreram em batalha.