As opções que vêm sido estudadas pela equipe econômica do governo Lula para rever os gastos públicos e atingir o equilíbrio fiscal nos próximos anos têm esbarrado na ala mais à esquerda do Partido dos Trabalhadores (PT).
A legenda do presidente da República tem resistência a ideias como a desvinculação da Previdência e de benefícios assistenciais do salário mínimo (com reajustes apenas pela inflação) e a revisões como o aumento da idade mínima de aposentadoria. Esse pacote tem sido estudado pela equipe liderada pelos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento e Orçamento), para serem apresentados como complemento aos cortes já indicados para 2024 e 2025.
Uma fonte da área social disse ao Metrópoles que muito se fala sobre o chamado “impostômetro”, mas pouco se toca no “sonegômetro”, ou seja, o governo precisa atacar a sonegação fiscal. Foi o que Haddad tentou fazer nesse um ano e nove meses de gestão, mas, agora, tem sido criticado pelo excesso de medidas arrecadatórias e pelo que seria uma leniência no lado das despesas.
Essa ala do PT que tem se colocado contrária às propostas também costuma ressaltar que os benefícios previdenciários representam cerca de 60% da renda de municípios do país, daí sua importância para a economia local. Por isso, cortá-los poderia gerar uma reação em cadeia.
Nessa quinta-feira (12/9), a presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), criticou publicamente um secretário da ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), por mudanças estudadas no Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago para quem tem a partir de 65 anos e a pessoas com deficiência de baixa renda.
O secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas do Ministério do Planejamento, Sérgio Firpo, disse, em entrevista ao jornal O Globo, que há estudos para alterar o BPC, aumentando, por exemplo, a idade mínima para 70 anos e desindexando os valores do piso nacional. Firpo é justamente o secretário de Tebet encarregado de revisão estrutural de gastos.
Gleisi disse que a ideia de desvincular o BPC do mínimo “significa um tremendo retrocesso, uma verdadeira covardia”. Marcando posição contra a equipe da emedebista, ela disse ainda que esse não é o tipo de reforma que o país precisa nem foi para isso que o presidente Lula (PT) foi eleito em 2022.
Reforma da Previdência no radar
No Ministério da Fazenda, já há quem advogue por uma nova reforma da Previdência, a menos de cinco anos depois da última revisão. A forte pressão do empresariado e da classe política sobre o assunto se deve ao déficit crescente dos três regimes da Previdência — o Regime Geral da Previdência Social (RGPS), que cobre os trabalhadores do setor privado e outros; o Regime Próprio da Previdência Social (RPPS), que provê cobertura para servidores públicos; e o Regime Privado Completar, cuja adesão é opcional.
No fim de 2019, primeiro ano do governo Jair Bolsonaro (PL), foi feita uma ampla mudança nas regras de aposentadoria e pensão, por meio de uma emenda constitucional. A aprovação das novas regras ocorreu depois de meses de debates no Congresso — iniciados ainda na gestão anterior, de Michel Temer (MDB) — e décadas de discussões na sociedade. O problema é que o déficit segue em alta.
Há quem entenda que a necessidade de uma nova reforma foi antecipada pela aprovação, no ano passado, da política de valorização do salário mínimo. Esse crescimento real do piso (acima da inflação) tem levado à ampliação das despesas previdenciárias, que são atreladas a ele, o que limita ainda mais a capacidade de investimento do Estado.
Em entrevista ao Metrópoles no fim de julho, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, disse que o governo faz um diagnóstico das despesas e sinalizou que revisão das regras previdenciárias está sempre no radar, mas não precisou quando uma reforma começará a ser efetivamente discutida.
“No momento, está sendo feito um grande diagnóstico olhando — isso vale para todas as despesas — como está, como elas estão em termos de dinâmica e o que precisa ser feito para assegurar que elas tenham uma dinâmica, que sejam sustentáveis e atendam quem precisa”, afirmou.
Ele acrescentou que é “natural” que, de tempos em tempos, seja preciso reorganizar o sistema para poder dar conta das novas realidades em termos de expectativa de vida e de número de beneficiários.
Uma das possibilidades mencionadas pela ministra Tebet é mexer com quem ficou de fora da última reforma, como é o caso dos militares, que são regidos por um sistema próprio e que acabaram sendo mais preservados que os trabalhadores da iniciativa privada e que servidores públicos.