Empresas de apostas online autorizadas pelo Ministério da Fazenda a operar até o fim do ano têm driblado regras de funcionamento fixadas pela pasta e podem estar violando o Código de Defesa do Consumidor.
A Folha de S.Paulo se inscreveu em 146 sites de apostas que constam na lista do Ministério da Fazenda para analisar a aderência dos sites à legislação, que entra em vigor a partir de 1 de janeiro de 2025. Um dos principais descumprimentos constatados é um veto a saques de valores ingressados nos portais, mas não apostados.
A regulamentação da pasta diz que os apostadores podem retirar seu saldo financeiro disponível sem restrição por parte do agente operador de apostas. A única exceção é para casos com indícios suficientes de fraude.
Pelo menos 79 sites impedem que recursos sejam sacados se eles não forem apostados pelo menos uma vez. Isso representa 54% do total dos portais testados. A última lista divulgada pelo governo federal tem 96 empresas e 210 sites de apostas online. Do total, não foi possível se registrar em 64 plataformas por problemas técnicos nas páginas ou por elas ainda não estarem ativas.
“A preocupação das plataformas é de alguma maneira servir como artifício para o jogador lavar dinheiro”, afirmou o diretor jurídico do IBJR (Instituto Brasileiro de Jogo Responsável), Rafael Marchetti.
“A pessoa deposita o dinheiro, saca e depois alega que a origem é a plataforma. Esse é o receio, mas não é prática de todas as empresas do setor”, acrescentou.
A lavagem de dinheiro é a principal preocupação do Ministério da Fazenda ao regulamentar o mercado de apostas de quotas fixas -modalidade na qual o apostador sabe quanto receberá em caso de aposta vencedora.
Para diminuir o risco, a pasta cobra dos sites medidas de verificação da identidade dos apostadores que se cadastram. As regras da Fazenda estipulam que isso deve acontecer durante a realização do registro, com o fornecimento de cópia digitalizada de documento válido de identificação com foto.
Apesar disso, 103 sites analisados pela Folha não fazem qualquer tipo de identificação até o depósito de dinheiro, 70% do total analisado.
“Que bom seria se já conseguíssemos aplicar todas as regras nesse momento.
A lei concedeu período no qual operadores poderiam continuar no formato que estavam até 31 de dezembro e todo o planejamento das empresas é de fazer adequação até esse dia”, afirmou o diretor de Comunicação da Associação Nacional de Jogos e Loterias, Leonardo Benites.
“Por muito tempo, a atuação dessas empresas se deu em terra de ninguém. Elas tinham sede em Curaçao ou Malta e com isso fugiam do controle legal e fiscal. Não tinha como forçar cumprimento de decisão judicial já que empresa não tinha sede ou representante legal no Brasil”, explicou o especialista em direito do consumidor Stefano Ferri.
Ele aponta que os apostadores têm outra proteção além das regras da Fazenda e o que já está em vigor no Código de Defesa do Consumidor.
“Tudo que viola o Código de Defesa do Consumidor hoje já pode ser objeto de ação judicial. Qualquer situação que coloque consumidor de onerosidade excessiva pode ser contestado, como isso de ser obrigado a apostar, por exemplo”, continuou.
A lista do Ministério da Fazenda é composta pelas empresas que solicitaram ao governo federal, até 17 de setembro, autorização para operar apostas até o fim de 2024. A data limite foi definida em portaria publicada pelo Ministério da Fazenda.
As bets que não estão na lista foram proibidas de oferecer apostas online. Em 11 de outubro, a Fazenda enviou à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) a lista com todas as bets que deveriam ser derrubadas -a agência então suspendeu os portais.